Caminhar

Caminhar

Caminhar como percurso que leva à mudança, a uma maior compreensão, mas também como rito de passagem o de iniciação, que atesta e ao mesmo tempo gere a fragilidade do momento de transição dum lugar ou estado (físico ou mental) para outro. Esta ideia de passagem inclui o breve período de existência duma vida (“A vida é um intervalo entre duas datas”, Christian Boltanski), e as relações estabelecidas, durante esse período, com outras vidas, sejam elas humanas ou não.

Caminhar como prática sagrada.

“Tem sido aí, “nas minhas caminhadas”, como escreveu H. D. Thoreau, que “tento recuperar a consciência”, afastando-me das solicitações funcionais da cidade e mergulhando inteira no espaço, tão real quanto intangível, em que eu e o que está em meu redor somos uma única entidade, orgânica e fluida, feita de ideias e sensações aleatórias e fugidias, que pulsam ao ritmo dos passos que o meu corpo, esquecido de si mesmo, dá, como se todas as moléculas que me compõem se distendessem e saíssem para fora de mim mesma. É nessas alturas que penso que a recuperação da consciência de que fala Thoreau, uma consciência alcançada por uma conexão profunda e não-pensada do sujeito indivíduo com o meio, exemplifica de forma eloquente uma possibilidade, talvez aquela que antecede todas as outras, de ultrapassar a cisão clássica, fundadora do dualismo moderno, entre sujeitos e objectos, entre nós e o que está fora de nós, a natureza, o território vital sem o qual não conseguimos viver.”1 (Rosendo, Catarina. 2019. “Desassossego climático”. In Leonorana. Porto, Portugal: Ed. Isabel Carvalho)

Caminhar é aguçar os sentidos, levá-los a níveis mais elevados. É entrar mais no ambiente e em si mesmo.

Caminhar como prática sagrada, as procissões, peregrinações até ao eu e à união com o mundo, sítio onde o particular e o universal se fundem.

Solvitur deambulando.

Kin hin – camminare consapevoli


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