João Silvério – um outro lugar, o lugar do espectador (2023)

Enquanto projecto, esta exposição propõe um encontro de dois percursos subjectivos: a partir da experiência de cada uma das artistas e de uma partilha com a paisagem desenhada pelo jardim que acolhe o espaço construído. A arquitectura, que dá corpo às salas de exposição, e o Jardim da Sereia são como contentores/ecrãs onde nos revemos enquanto parte destes espaços orgânicos que se prolongam numa relação concomitante. No repto lançado às duas artistas, Ana Pérez-Quiroga e HElena Valsecchi, um acontecimento, mais precisamente uma ideia, surgiu a partir de uma leitura pessoal do texto «Autobiografia de um Espectador», do livro de Italo Calvino O Caminho de San Giovanni1, que sempre me interessou. Neste texto, enquanto experiência remissiva da memória, Calvino descreve, de modo detalhado, a sua experiência como espectador apaixonado pelo cinema, durante o período do regime fascista em Itália, sinalizando, por exemplo, as diferenças temáticas entre modelos estéticos e políticos do cinema europeu, principalmente em Itália e em França, e do cinema norte- -americano. O autor tece diversas considerações acerca de personagens, modos de produção e do contexto social, político e cultural nesse período histórico em Itália. A forma autobiográfica deste texto declara uma estreita ligação a Federico Fellini, à qual dedica uma parte substancial do texto e que revela essa propensão para a condição de espectador. «Por exemplo a obra de Fellini é o que mais se aproxima desta biografia de espectador que ele próprio me convenceu agora a escrever; só que nele a biografia se trans- formou em cinema por sua vez, e é o lá fora que invade o écran, o escuro da sala que se despeja no cone de luz.»2 Italo Calvino revela ainda que «Depois (para retomar o fio da biografia individual) entrei cedo no mundo do papel escrito, que por alguma das suas margens confina com o mundo do celulóide»3. Esta dualidade, por um lado aparente, entre estes dois autores, na condição transitória de ser espectador do mundo e, por outro, de agir enquanto artista/autor que se expressa através de uma prática auto-refe- rencial, permite-nos pensar no seu lugar, onde se situa, e onde nos situa em presença da sua obra. Sob este aspecto, o cinema, enquanto metáfora, ou processo especulativo e ficcional, representa uma ideia de transição no tempo, e assim de relacionamentos na vida emocional e material. É nesta correlação de fragmentos, como imagens-movimentos que ocorre um processo discursivo de montagem.
Este cruzamento entre a arte e a vida, na linha de uma construção cine- matográfica, integra procedimentos como a repérage e a edição, e reconfigura o lugar do espectador num campo de possibilidades que se propõe, através da experiência artística, reequacionar a nossa própria experiência, aindaque por breves momentos, nas salas da exposição. Partilhar do sentimento de perda, ou de paixão, da fragilidade de um percurso, e de uma memória do orpo e do espírito — surgem diversas interrogações sobre as formas e modalidades que estes podem assumir. Seja no desenlace de um aconte- cimento ou numa outra forma de respirar, transparente com um alvéolo, desenha-se uma correspondência que a amplitude das janelas faz ressoar no jardim, e nas salas que se transformam em ecrãs. Nesta transmutação, podemos imaginar um prado e um piquenique sob um céu pintado que nos envolve, como os desenhos de caminhos e palavras luminosas, a paisagem em aparente suspensão.
A exposição é construída sobre a métrica da arquitectura e as visões que esse jardim provoca, reconfigurando o mapeamento de lugares, espaços e percursos das duas propostas artísticas que partilham da sala central. Neste itinerário, a ideia de encontro entre dois pontos de observação, duas formas de olhar introspectivas, propõe uma reflexão sobre o devir, enquanto experiência que se actualiza no resgate de indícios da memória, e que desenham uma ambiência poética, por momentos compulsiva, e espiritual.
Duas obras, «Desenlace do acontecimento», de Ana Pérez-Quiroga, e «O que nos olha», de HElena Valsecchi, conduzem-nos a uma reflexão sobre o que é intangível e transitório. Em Pérez-Quiroga, encontramos o que nos é dado a ver de, precisamente, um acontecimento sobre o qual nada sabemos. Os diversos objectos de cobre rememoram uma coreografia perdida: são sapatos de mulher, fósforos, um charuto, o corta-charuto e, de entre outros, o eyeliner. São residentes obnubilados pela irregularidade da memória que apenas se reconfigura em presença de quem nela participa. Estes objectos de uso, mas também de desejo, inscrevem em si mesmos uma espécie de memorial que resguarda uma história, associada aos géneros feminino e masculino, ao amor e a outras emoções que parecem escapar-nos. Não sabemos a que corpos pertenceram, porventura anónimos, como figurantes de uma ausência. Onde quase tudo o que pode sobreviver à dialéctica da queda, e da morte, lhes sucede. Neste contexto, a obra «O que nos olha», de Valsecchi, concorre para esta contradição entre o que resta de uma presença e a sua possibilidade enquanto resgate simbólico e evocativo. Esta obra tem a forma de uma urna funerária, executada em vidro soprado. Está suspensa no espaço, transparente como um óculo, ou uma imagem, que tudo pode revelar e simultaneamente ocultar. A urna está selada com cera branca de abelha, como um objecto votado ao ritual da ausência. Contudo, a sua transparência anuncia uma ultrapassagem de uma evidência da morte, e assim um sentido de liberdade. É, deste modo, uma forma ovóide, que religa o nascimento e a morte, erguendo-se numa apologia da ascese sem glorificar nenhuma memória, e na sua fluidez vítrea revisita o passado da vida material.
O corpo, enquanto registo da sua ausência, apresenta-se nesta exposição como uma memorabilia em permanente reconstrução. Do ponto de vista do espectador, essa reconstrução parece determinar um mapeamento de territórios imprecisos, moldados por desejos e emoções, e por isso impossíveisde apreender como uma totalidade num primeiro vislumbre, como na paisagem que se declara no espaço e na relação com as obras expostas: como o jardim. «Numa paisagem, a unidade das partes, a sua forma, vale menos que o seu extravasamento; não existem contornos francos, cada superfície treme e organiza-se de tal maneira que abre essencialmente para o exterior.»4 O jardim, na sua multiplicidade, é o lugar da alteridade, da experiência do Outro, da ligação do Céu e da Terra, do olhar que entrevê e que escuta. Nesta aproximação ao jardim, as duas salas, extremas na geografia do espaço da exposição, constroem-se metanarrativas, que dialogam entre si através de uma poesis do movimento, seja este inscrito na memória auto-referencial que as imagens, algumas como matéria esculpida, e a palavra enunciam, ou na fisicalidade expressionista de uma acção performativa.
«As seduções do desejo», de Ana Pérez-Quiroga, e uma outra obra, «Ser Frágil», de HElena Valsecchi, confrontam-nos com um imaginário que remete para acontecimentos e imagens indissociáveis de uma construção de paisagens habitadas. «As seduções do desejo», uma obra na esteira do «Breviário do Quotidiano»5, que Pérez-Quiroga tem construído no decorrer do seu trabalho, diz-nos que «por um lado temos o mundo das coisas tangíveis, físicas, e do outro (talvez mesmo a seu lado) o universo das afec- ções humanas, subjectivas e cuja visibilidade depende das características identitárias de cada indivíduo. A tristeza, a vergonha, a aversão, a ira, o medo, o prazer, o amor ou a surpresa são zonas de conflito e de tensão interior que emergem como formas de expressão psico-sociais. Os seus traços reconhecíveis são por vezes linhas ténues que se descobrem no olhar, num esgar de um rosto ou em determinado objecto que denuncia sinais de pertença revelando determinadas características de um ou mais sujeitos»6. Neste sentido, esta instalação transforma a sala da exposição num outro espaço, como se um encontro, de memórias, referências, desejos e sonhos, ali tivesse ocorrido. A instalação parece familiar, composta por diversos elementos, por exemplo: «Mover para fora» é um toldo, como um céu pintado numa evocação da pintura da artista norte-americana Helen Frankenthaler; em «5 Jardins Idílicos», encontramos várias referências, como a Monet (Le Dejeuner sur L’Herbe e outras pinturas de paisagem imaginárias percorrem a memória de quem se juntar ao panorama destepiquenique); a «Cesta para Picnic» é composta por dezasseis esculturas, revestidos de cobre, como se fossem sujeitos de uma taxidermia, enquanto representação de um momento; «Natureza morta #8» é composta por pão e fruta fresca; «¡No te vayas!» é uma frase, em néon azul, que nos devolve a janela em frente do Jardim da Sereia, como se esse jardim encerrasse um partida sem regresso; e, de entre outras, «Natura #8», a sonoridade melan- cólica de um jardim. Esta sonoridade é próxima do som que integra a obra «Ser Frágil», de Valsecchi, e, de facto, parece ser apenas uma semelhança. Contudo, essa aparente semelhança é como uma empatia relacional com um contexto comum, um lugar de outros lugares, que pode ser um jardim ou outra paisagem que rememora uma sonoridade do mundo, que, no caso de Valsecchi, é interrompida pela radicalidade que qualquer mudança pode requerer. Os pés desnudados caminham sobre rectângulos de vidro respi- gados em molduras devolutas, no atravessamento de viviências anónimas.
Toda a acção requer breves momentos da nossa atenção, e regressa sob o controlo que o meio videográfico lhe permite. Este movimento circular apela à ruptura, numa pulsão orgânica e metafísica, como uma metáfora de uma passagem, entre a chegada e o caminho. Esta obra denuncia um regresso da artista à leitura, se assim se pode dizer, da obra de Christian Boltanski, e à importância de um correlato da memória na obra de arte.7 No chão dessa sala, «Instantâneo», uma instalação composta por mais de vinte esculturas em vidro soprado sobre objectos encontrados (como pedras e madeiras de proveniência diversa) durante as suas caminhadas, uma prática recorrente no trabalho de Valsecchi. Esta obra remete para um encontro entre o que é mineral e o corpo humano, numa expressão de corporalidade universal, ecológica no sentido da união entre o humano e a terra que o acolhe. É um sopro translúcido e aparentemente volátil, numa medida de tempo imediata, como transição do devir que é viver, partir, voltar a partir, e regressar sob formas indefinidas, como estas esculturas revelam.
O lugar do espectador propõe-se como um encontro entre a ficção e a realidade mediada por dois imaginários que se desdobram e constroem, para lá das narrativas da vida material: um processo operativo enquanto prática artística em permanente edição.

João Silvério

O autor não segue o Acordo Ortográfico em vigor.

1 «Autobiografia de um espectador», em Italo Calvino, O Caminho de San Giovanni, Editorial Teorema, 2002, p. 51
2 Ibidem, p. 79.
3 Ibidem, p. 76.

4 Cf. Michel Corajoud, «A Paisagem é o lugar onde o céu e a terra se tocam», em Filosofia da Paisagem – Uma Antologia, Lisboa: Centro de Filosofia da Universidade de Lisboa, 2011, p. 216.
5 Sobre a obra de Ana Pérez-Quiroga, ver os seguintes links: https://fasciniodafotografia.com/2016/06/14/ana-perez-quiroga- -breviario-do-quotidiano-8-os-regimes-acumulativos-dos-objetos- -e-as-suas-determinantes-2016/ www.apqhome.anaperezquirogahome.com

6 Cf. o texto da minha autoria para a exposição Vrais Objects Terouvés, ou uma reflexão sobre as emoções. Fundação das Casas de Fronteira e Alorna, Camara Municipal de Ponte de Sor, 2008: https://www. anaperezquiroga.com/Content/Files/Textos/catalogo_vrais_objets.pdf

7 Texto da minha autoria para a exposição intitulada Synecdoche, realizada na Galeria da Livraria Sá da Costa em Lisboa, em 2022. A referência a Christian Boltanski está ligada a uma certa ideia de espiritualidade na arte, presente na obra de Valsecchi, enquanto referência à evocação da memória. https://elenavalsecchi.com/synecdoche-text/


En

Another place – the place of the spectator
As a project, this show proposes an encounter of two subjective pathways. The first arises from the experience of each artist and the second from a sharing with the landscape defined by the garden surrounding the exhi- bition space. The architecture that embodies the exhibition rooms and the Jardim das Sereias [the Mermaid Garden] are like containers/screens where we see ourselves as part of these organic spaces that extend in a concurrent relationship. The challenge proposed to the two artists, Ana Pérez-Quiroga and HElena Valsecchi, emerged from a personal reading of the text “A Cinemagoer’s Autobiography” from Italo Calvino’s The Road to San Giovanni,1 a book that has always interested me. In this text, a recollective experience of memory, Calvino meticulously describes his experience as a passionate cinemagoer during the period of the fascist regime in Italy, signaling, for example, the thematic differences between aesthetic and political models of European cinema, mainly in Italy and France, and North American cinema. The author makes several considera- tions about characters, modes of production, and the social, political, and cultural context of that historical period in Italy. The autobiographical form of this text declares a close connection to Fellini, to whom he dedicates a substantial part of the text that reveals his propensity for being a spectator. “For example, Federico Fellini’s work very closely approximates my own cinemagoer’s biography, which Fellini himself recently convinced me to write; except that for him biography has become cinema, it is the outside world that invades the screen, the dark of the theatre turned inside out in the cone of light.”2 Italo Calvino further reveals that “At this point (to pick up the thread of individual biography) I quickly got involved in the world of the printed page, which along one margin or another borders on the world of celluloid.”3 The duality between these two authors, their transitory condition of spectators of the world overlapping their agency as artists who express themselves through a self-referential practice, allows us to think about where Calvino situates himself and where he situates us in the presence of his work. From this perspective, cinema, as a metaphor or a speculative and fictional process, represents an idea of transition in time and, thus, of relationships in emotional and material life. In this correlation of fragments, as images — or motion — a discursive montage process occurs.
Along the lines of a cinematographic construction, this intersection between art and life integrates procedures such as repérage and editing and reconfigures the place of the spectator into a field of possibilities that proposes, through artistic experience, to re-equate our own experience,even if for brief moments, in the exhibition rooms. Sharing the feeling of loss, or of passion, the fragility of a path, and of a memory of body and spirit, several questions arise about the forms and modalities that these can assume. Whether in the denouement of an event or in another way of breathing, transparent like an alveolus, the artists propose a correspon- dence that resonates in the garden through the amplitude of the windows and echoes in the rooms while transforming them into screens. In this transmutation, we can imagine a meadow and a picnic under a painted sky that envelops us, like the drawings of paths and luminous words, a seemingly interrupted, suspended landscape.
The exhibition is built on the metrics of the gardens’ architecture and suggested visions. The show reconfigures the mapping of the venue’s spaces and paths between the two artistic proposals that share the central room. In this itinerary, the idea of a meeting between two points of observation, two introspective gazes, proposes a reflection on the act of becoming—an experience that is actualized in the recovery of traces of memory and draws a poetic and spiritual, at times compulsive, ambiance.
Two works, Desenlace do acontecimento [Outcome of the event], by Ana Pérez-Quiroga, and O que nos olha [What looks at us], by HElena Valsecchi lead us to a reflection on the transitory and the intangible. In Pérez-Quiroga we find what we are given to see of an event about which we know nothing. The various copper objects recall a lost choreography: women’s shoes, matches, a cigar, a cigar cutter, and, among others, eyeliner. They are residents obscured by the irregularity of a memory that is only reconfigured in the presence of those who participate in it. These objects of use, but also desire, inscribe in themselves a kind of memorial that holds a history associated with the feminine and masculine genders, with love and other emotions that seem to escape us. We don’t know to which bodies they belonged, perhaps anonymous as extras of an absence succeeded by everything that can survive the dialectics of the fall and death. In this context, Valsecchi’s piece, O que nos olha, contributes to this contradiction between what remains of a presence and its possibility as a symbolic and evocative rescue. This work has the shape of a blown glass funerary urn. It is suspended in space, transparent like a spyglass, or an image, which can simultaneously reveal and hide everything. The urn is sealed with white beeswax, like an object dedicated to the ritual of absence. However, its transparency announces an overcoming of an evidence of death, and thus a sense of freedom. It is, therefore, an ovoid form, which links birth and death, rising in an apology for asceticism without glorifying any memory, and in its vitriolic fluidity, revisits the past of material life.
As a record of its absence, the body is presented in this exhibition as memorabilia in permanent reconstruction. From the spectator’s point of view, this reconstruction seems to determine a cartography of imprecise territories shaped by desires and emotions and, therefore, impossible to apprehend as a totality at first glimpse. This is the case of the landscape that is declared in the space and in the relationship with the exhibitedworks: the garden. “In a landscape, the unity of the parts, their shape, is worth less than their spillover; there are no sharp contours, each surface trembles and organizes itself in such a way that it essentially opens to the outside.”4 In its multiplicity, the garden is the place of otherness, of the experience of the Other, of the connection of Heaven and Earth, of the gaze that glimpses and listens. In this approach to the garden, the two rooms, opposites in the geography of the exhibition space, build meta-narratives, which dialogue among themselves through a poetics of movement, whether this is inscribed in the self-referential memory that the images, some as sculpted matter, and the word enunciate, or in the expressionist physicality of performative action.
As seduções do desejo [The Seductions of Desire], by Ana Pérez-Quiroga; and another work, Ser Frágil [Being Fragile], by HElena Valsecchi con- front us with an imaginary that refers to events and images inseparable from the construction of inhabited landscapes. As seduções do desejo, a work in the wake of the Archive of Daily Life5 that Pérez-Quiroga has been building throughout her career, tells us that “On one side we have the world of tangible things, physical, and on the other (perhaps exactly at its side) the subjective universe of human affections, whose visibility depend on identical characteristics to each individual. Sadness, shame, aversion, anger, fear, pleasure, love or surprise are zones of conflict and interior tension that emerge as psycho-social forms of expression. Their recognizable features are at times faint lines that unveil in a glance, in a grim face or in a determined object that denounces signals of belonging disclosing definitive characteristics of one or more subjects.”6 In this sense, this installation transforms the exhibition room into a space that follows up on an encounter of memories, references, desires, and dreams. The installation has a familial hue, composed of various elements: Mover para Fora [Moving Outside], an awning that projects itself like a painted sky in an evocation of the painting by the American artist Helen Frankenthaler; 5 Jardins Idílicos [5 Idyllic Gardens] a juxtaposition of several references, such as to Monet, his Le Dejeuner sur L’Herbe and other imaginary landscape paintings that may come to the memory of those who join this picnic); the Cesta para Picnic [Picnic Basket], composed of sixteen copper-linedsculptures, presented like taxidermal specimens and representations of a moment; Natureza morta #8 [Still Life #8], composed of bread and fresh fruit; ¡No te vayas!, a phrase in blue neon that returns us to the window in front of the Mermaid Garden, as if this garden enclosed a departure with no return; and among others Natura #8, the melancholy sound of a garden. This sonority is close to the sound that is part of Valsecchi’s Being Fragile and seems to be only a resemblance. However, this apparent simi- larity is like a relational empathy with a shared context, a place of other places that may be a garden, or another landscape that recalls a sonority of the world that, in Valsecchi’s case, is interrupted by the radicality that any change may require. The bare feet walk on glass rectangles gleaned from discarded frames in the intersection of anonymous experiences. The whole action requires brief moments of our attention and returns under the control that the videographic medium allows. This circular movement calls for a rupture as an organic and metaphysical pulsion. It is a metaphor of passage, halfway between the journey and the journey’s end. This work signals the artist’s return to a reading—if one can say so—of Christian Boltanski’s work, and the significance of a correlate of memory in the work of art.7 On the floor of this room, Instantâneo [Snapshot], an installation composed of over twenty blown glass sculptures made from found objects (such as stones and wood of diverse provenance) collected by the artist during her walks, a recurrent practice in Valsecchi’s work. This work refers to an encounter between the mineral and the human, an expression of a universal corporality, ecological in the sense of the union between humans and Earth. It is a translucent and volatile breath, in an immediate measure of time that signals the transition between becoming, to be, and to cease to be—and to begin again in indefinite forms, as these sculptures reveal.
The place of the spectator proposes an encounter between fiction and reality mediated by two imaginaries that unfold and construct, beyond the narratives of worldly life, an operative process that defines an artistic practice in continuous transformation.

João Silvério

1 Calvino, I. (2014). “A cinemagoer’s autobiography”. In The Road to San Giovanni. Mariner Books.
2 Idem, p. 64.
3 Ibidem, p. 61.

4 See Michel Corajoud, “A Paisagem é o lugar onde o céu e a terra se tocam”, in Filosofia da Paisagem – Uma Antologia, Lisboa: Centro de Filosofia da Universidade de Lisboa, 2011, p.216.
5 On Ana Pérez-Quiroga work, please see the following links: https://fasciniodafotografia.com/2016/06/14/ana-perez-quiroga- -breviario-do-quotidiano-8-os-regimes-acumulativos-dos-objetos- -e-as-suas-determinantes-2016/ www.apqhome.anaperezquirogahome.com

6 Here I quote my text for the exhibition Vrais Objects Trouvés, ou uma reflexão sobre as emoções, Fundação das Casas de Fronteira e Alorna, Câmara Municipal de Ponte de Sor, 2008 https://www.anaperezquiroga.com/Content/Files/Textos/catalogo_ vrais_objets.pdf

7 Here I refer to the text I wrote for the show Synecdoche, at the gallery of Sá da Costa library, in Lisbon, 2022. The reference to Christian Boltanski hints at a certain idea of spirituality in art, which is present in Valsecchi’s work as an evocation of memory. https://elenavalsecchi.com/synecdoche-text/